Até o Google está confuso. Há dois meses, quem digitasse “inception + theory” seria levado para grupos de discussão do livro “A Origem das Espécies”, de Charles Darwin. Hoje, o internauta é dirigido para milhares de páginas que desdobram nos mais variados níveis o filme no qual Leonardo DiCaprio interpreta um ladrão de sonhos com a missão de inserir uma ideia na cabeça do herdeiro de um império econômico.
Somente no fórum sobre o filme no IMDB, o mais popular site de informações sobre cinema, existem mais de mil tópicos. No Facebook, quase 1,8 milhões de pessoas sinalizaram ter “curtido” o filme. No Twitter, “Inception” está nos trending topics há pelo menos um mês. Na história recente, apenas o filme “Matrix”, em 1999, e o seriado “Lost”, que terminou este ano, foram capazes de gerar frenesi parecido. Em comum, os três trazem a mistura bem dosada de ficção científica, fantasia e ação, em uma narrativa não linear. O resultado também foi o mesmo: milhões de pessoas discutindo os mais ínfimos detalhes, fazendo surgir um universo original e autônomo que foge ao controle dos criadores das obras.
Pululam na internet teorias para explicar o final de “A Origem”, análises psicanalíticas sobre temas como memória e culpa, informações sobre como as pessoas podem “dirigir” seus sonhos para se livrar de pesadelos (com tratamentos terapêuticos ou farmacológicos) e até experiências sonoras como aquela em exibição no YouTube. Internautas diminuíram a rotação da canção “Non, Je Ne Regrette Rien”, escolhida pelos personagens para serem “chutados” do estado de torpor para a realidade, até o ponto em que ela parece se fundir com a trilha incidental composta por Hans Zimmer, como a sugerir que a todo tempo os personagens estivessem para ser despertados. Sobre a canção, aliás, vale citar que ela é interpretada por Edith Piaf, que foi encarnada no cinema por Marion Cotillard, que, por sua vez, faz em “A Origem” a mulher de Dom Cobb, que, por sua vez, ao contrário do que diz a letra em francês, vive no arrependimento.
No Brasil, um dos sites mais acessados sobre o assunto é o Saindo da Matrix, do pernambucano que atende pelo pseudônimo de Acid. Suas teorias sobre “A Origem” mesclam um pouco de tudo, indo do espiritismo à mitologia e utilizando conceitos de psicanálise.
Para Acid, o zunzunzum gerado era esperado desde o início: “A Origem não é uma experiência passiva, ordenada. Somos apresentados a um mundo e depois somos chutados dele porta afora do cinema, e de alguma forma queremos mais, queremos prolongar essa sensação, essa experiência. Por isso voltamos a ver o filme, comparamos detalhes, trocamos ideias e percebemos coisas novas cada vez que o revemos.”
À receita do bolo, a psicanalista Diana Corso acrescenta: “Discutir os sonhos, e tudo o que eles encerram, leva a um autoconhecimento inédito e bem vindo. Existe um desejo de compartilhar o mistério, talvez por essa ideia de que existe mais por dentro de nós mesmos do que conhecemos. É uma massa de gente compartilhando a consciência do inconsciente.”
Mas como todo hype, “A Origem” dividiu a opinião dos críticos no Brasil. Boa parte mostrou-se cética com relação à ambiciosa proposta de Nolan.
Contém Spoilers – Debruçando-se sobre o filme
A sociedade do anel Quem viu “O Sexto Sentido” sabe que, sempre que um espírito estava presente, algum objeto vermelho era mostrado na cena. Assim, era possível – assistindo uma segunda vez – distinguir que, de fato, um dos personagens estava morto. Em “A Origem”, o anel de noivado de Cobb é o que indica se ele está sonhando ou acordado. Partindo do pressuposto de que ele só vê a esposa no mundo dos sonhos, e que nele ele ainda a ama (tanto que não a mata quando tem a oportunidade), nada mais natural do que manter o adereço. Já no mundo real ele não usa o anel. Um detalhe que não passou despercebido pelos fãs do site Revolving Door Project, que congelaram trechos do filme nos quais aparece a mão de Leonardo DiCaprio para comprovar sua teoria.
Totem é tatabu
O site Cinema Blend teorizou a respeito de um detalhe do final: o pião cai ou não? Pela lógica, isso definiria se Cobb está sonhando. Para os responsáveis pelo site, o fato de o totem funcionar apenas no sonho de outra pessoa permitiria ao sonhador (no caso Cobb) manipular seu próprio totem quando no seu próprio sonho e, assim, enganar-se.
Crianças iguais? Outro detalhe controverso da cena final é o que mostra Cobb reencontrando os filhos na volta ao lar. As crianças estão vestidas praticamente com as mesmas roupas com que eram vistas em suas memórias e sonhos, têm o mesmo porte físico e estão posicionadas de maneira similar. Então, tudo não passaria de um sonho? Uma consulta ao site Internet Movie Data Base (IMDB) indica que não: no elenco de “A Origem” constam dois atores mirins, um mais novo e outro mais velho, para interpretar cada um dos filhos de Cobb. Logo, os guris podem até serem parecidos, mas – oficialmente – não são os mesmos. E as roupas são diferentes, afirmou categoricamente Jeffrey Kurland, responsável pelo figurino, ao site Clothes On Film.

O site Saindo da Matrix diz que o grande manipulador por trás das ações de Cobb é seu sogro, Miles (Michael Caine). Em sua última conversa, na sala de aula da universidade onde Miles leciona, ele “planta” na cabeça do ladrão a ideia de que deveria se perdoar pela morte da mulher e voltar para os filhos. Como cúmplices, o veterano professor usaria uma nova pupila, a arquiteta Ariadne, o químico Yusuf e o empresário Saito. Todos ajudariam o rapaz a pacificar os pesadelos referentes a Mal ao mesmo tempo em que cumprem a missão em Fischer. São duas as possibilidades: ou Miles estaria manipulando Cobb desde o encontro em Paris ou o processo começa na África, quando ele testa o poderoso sonífero que o faria dormir – até o fim.
Fonte: Jornal A Notícia
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